E se eu te dissesse que todas as suas escolhas, desde o que você escolheu comer no café da manhã até a carreira que decidiu seguir, não foram realmente feitas por você? E na verdade, são apenas partes de um roteiro que já estava escrito?
Eu sei, parece coisa de filme de ficção científica, mas essa é uma das maiores discussões de toda a humanidade: a disputa entre o Determinismo e o Livre Arbítrio. E até o final deste texto, vou te mostrar como até mesmo uma maçã pode provar que NÃO somos tão livres quanto imaginamos. Então, sejam muito bem-vindos ao blog do Sala Vazia.
Uma escolha simples?
Imagine que você acabou de acordar e percebeu que estava com fome. Você então, decide tomar o seu café da manhã, vai até a cozinha, se senta na mesa e se depara com uma simples escolha: comer uma banana ou uma maçã?
Ao pensar por alguns segundos, você escolhe a maçã, porque afinal, você gosta mais de maçãs do que de bananas, e você quer a maçã. Dessa forma, podemos dizer que você teve a liberdade para escolher a maçã porque quis.
Mas espere... foi mesmo você que escolheu querer a maçã? Você realmente teve a escolha de gostar mais de maçãs do que de bananas?
E não para por aí. Você ainda iria até a cozinha e se sentaria para tomar seu café, se o seu corpo não tivesse te alertado que estava com fome e precisava comer?
A Vontade que Não Escolhemos
No século XIX, o filósofo alemão Arthur Schopenhauer dizia:
"O homem pode fazer o que quer, mas não pode querer o que quer".
Essa frase, presente em sua obra "O Mundo como Vontade e Representação" (1819), resume uma ideia poderosa: temos a liberdade de agir de acordo com nossos desejos, mas os próprios desejos podem não ser resultado de uma escolha livre. É como se estivéssemos em um mercado. Temos a liberdade de escolher entre os produtos que nos são apresentados, mas não a liberdade de escolher as opções em si.
Você pode estar pensando: "Se eu só fizesse o que eu quero, com certeza eu não iria pegar ônibus lotado, sentir o cheiro daquela pizza debaixo do braço do Joãozinho para ir trabalhar todos os dias. Mas eu vou mesmo sem querer, logo, eu tenho livre arbítrio".
Mas é aí que tá. É verdade, você não quer ir trabalhar numa segunda-feira, você quer ficar em casa. Mas sabe o que você quer mais ainda do que ficar em casa? Ter uma casa, e de preferência não morar debaixo da ponte. Nesse caso, o desejo maior vence, e você vai trabalhar. Você não tem o livre arbítrio para querer morar debaixo da ponte.
É como se você recebesse um conjunto de desejos, e o maior deles vencesse, causando a sua ação. E sim, às vezes fazemos coisas que preferimos não fazer, mas isso também é impulsionado por desejos fora do nosso controle. Quando fazemos algo, isso é sempre impulsionado pelo que queremos, mesmo que o desejo seja sofrer agora para ser recompensado depois.
E essa ideia de que não somos livres se chama DETERMINISMO.
O Que é o Determinismo?
Imagine que o universo é uma máquina gigante, onde cada engrenagem, cada movimento, está conectado e leva ao próximo. O Determinismo parte dessa ideia: tudo o que acontece no presente e vai acontecer no futuro é apenas uma consequência de eventos que já aconteceram. Não há espaço para o acaso ou para "escolhas" de verdade. Tudo já está determinado.
Argumento 1: A Biologia dita as regras?
Muitos dos nossos desejos, no fundo, são influenciados por simples reações químicas, tendo uma motivação biológica.
Por exemplo, uma das maiores motivações do ser humano é a busca por um parceiro. Mas será que essa ainda continuaria sendo uma das maiores motivações da humanidade se o seu próprio corpo não produzisse uma porrada de hormônios como a oxitocina (o hormônio do "abraço" e da ligação social) e a dopamina (o hormônio do prazer e da recompensa), e não te recompensasse após o coito? E se não precisássemos nos reproduzir para levar a espécie adiante? Esse ainda seria um dos maiores desejos da humanidade?
Outro exemplo: a fome. Você escolhe ter fome? Não. A fome é uma série de sinais químicos e biológicos que seu corpo envia para garantir sua sobrevivência. Quando você está com fome, hormônios como a grelina são liberados, sinalizando ao seu cérebro que é hora de comer. E quando você come, o prazer que sente é uma recompensa química, causada pela liberação de dopamina, reforçando esse comportamento para que você continue buscando alimento. Nossas necessidades mais básicas são, na verdade, instruções biológicas pré-escritas.
A Influência Hormonal
Os hormônios são mensageiros químicos que levam recados ao seu cérebro, influenciando suas decisões:
- Cortisol: Se você produz mais Cortisol, o hormônio do estresse, pode ter mais dificuldade em tomar decisões, desistir mais fácil e ter uma chance maior de desenvolver transtornos como depressão e ansiedade.
- Ocitocina: Já com mais Ocitocina, o "hormônio do amor", você pode ter mais facilidade para fazer amigos, ser mais confiante e cuidadoso, o que poderia te levar a profissões de cuidado, como medicina ou enfermagem.
- Dopamina: Níveis elevados de Dopamina podem facilitar vícios. Se bem regulados, podem aumentar o foco e a persistência para alcançar objetivos.
- Testosterona: Muita Testosterona pode te tornar altamente competitivo, mas também mais propenso à violência, podendo influenciar até mesmo atos criminosos.
Claro, os hormônios atuam como um "empurrão", não determinando necessariamente quem você será, mas influenciando fortemente. Isso levanta a questão: será que realmente temos livre arbítrio?
Neurociência e as Decisões "Inconscientes"
A ciência também aponta para o determinismo. Em um famoso estudo de 1983, o neurocientista Benjamin Libet pediu a voluntários que movessem a mão quando sentissem vontade, enquanto monitorava seus cérebros.
Ele descobriu algo surpreendente: a atividade cerebral que indicava a decisão de mover a mão aparecia cerca de 300 milissegundos antes que a pessoa tivesse consciência de sua própria decisão. Ou seja, parece que o cérebro "decide" antes mesmo de você se dar conta de que decidiu.
O Problema do Determinismo e a Cultura Pop
Ok, mas se um criminoso não teve escolha a não ser cometer um crime porque já estava determinado, podemos realmente culpá-lo? Se tudo está determinado, nada pode ser modificado de verdade.
Esse dilema já apareceu várias vezes no cinema. No filme Minority Report (2002), a polícia prende criminosos antes que os crimes aconteçam. A grande questão é: se o futuro já foi visto, a pessoa tem mesmo escolha de não fazer aquilo?
Já na série Dark (2017-2020), vemos personagens viajando no tempo para tentar mudar o passado, mas acabam, ironicamente, fazendo com que tudo aconteça exatamente como sempre foi. É um ciclo sem fim, onde o destino parece ser imutável.
A ideia de livre arbítrio é fundamental para nossos sistemas legais e morais. Afinal, como punir uma pessoa que não tinha escolha a não ser fazer o que fez?
O Que é o Livre Arbítrio?
Do outro lado do ringue, temos o Livre Arbítrio. Essa ideia defende que somos responsáveis por nossas ações, tendo a capacidade de dizer "sim" ou "não". Mesmo com influências químicas, conseguimos fazer escolhas reais e criar um futuro diferente.
A Neuroplasticidade e a Capacidade de Mudança
Enquanto o estudo de Libet sugere que o cérebro decide antes de nós, a neurociência também revela algo incrível: nossa capacidade de mudar o próprio cérebro. Isso se chama neuroplasticidade.
Imagine aprender a tocar violão. No início, é um desastre. Mas a cada prática, novas conexões entre os neurônios são construídas e fortalecidas. Seu cérebro se reorganiza e literalmente muda para que você se torne bom naquilo.
O mesmo acontece com a meditação. Ao praticar, você não está apenas relaxando; está modificando áreas do cérebro ligadas à atenção e ao controle emocional, tornando-se uma pessoa mais paciente.
Isso mostra que não somos totalmente pré-programados. Nossas escolhas e aprendizados têm o poder de mudar nosso próprio cérebro e, com isso, mudar quem nós somos, reforçando a ideia de que talvez tenhamos, sim, Livre Arbítrio.
A Encruzilhada: Existe um meio termo? O Compatibilismo
Ok, ambos os lados têm bons argumentos. Somos livres ou tudo está determinado? É aí que entra o Compatibilismo, a ideia de que não somos nem completamente determinados, nem completamente livres.
O compatibilismo argumenta que nossas escolhas podem ser influenciadas por nossa biologia e criação, mas ainda assim temos espaço para tomar decisões conscientes. O livre arbítrio não seria a capacidade de agir sem influências, mas sim de agir de acordo com os próprios desejos, mesmo que esses desejos sejam determinados. Para um compatibilista, você é livre se faz o que quer, independentemente do porquê de você querer isso.
O filósofo escocês David Hume foi um dos grandes nomes do compatibilismo. Para ele, a liberdade é poder agir de acordo com a própria vontade, sem coerção externa. Uma ação é livre se ela vem de quem você é, mesmo que suas motivações sejam influenciadas por reações químicas.
Voltando ao exemplo da maçã: você escolheu a maçã porque queria a maçã. Para um compatibilista, essa é uma escolha livre, porque partiu de você, e não de outra pessoa te forçando.
Conclusão
Afinal, temos livre arbítrio ou somos apenas marionetes? A ciência e a filosofia mostram que a resposta não é simples. De um lado, a biologia e a neurociência apontam para fortes influências em nossas decisões. Do outro, nossa intuição e a incrível capacidade de mudar nosso cérebro com a neuroplasticidade nos dão esperança de que podemos, sim, ser livres.
Talvez a verdade esteja no meio termo. Somos livres para agir de acordo com nossos desejos, mas não para escolher os nossos desejos. E isso não tira a responsabilidade de nossas ações, porque elas ainda refletem nosso caráter.
No fim das contas, o importante é o que fazemos com essa dúvida. Questionar o livre arbít-rio pode nos fazer pensar: será que a escolha que estou fazendo é realmente minha ou são apenas influências biológicas me guiando?
Mas e você, o que acha? Acredita que vivemos em um determinismo, temos livre arbítrio, ou as duas coisas ao mesmo tempo? Deixe seu comentário aqui embaixo, queremos muito saber sua opinião sobre isso.
E se você quer saber como MAMILOS (isso mesmo, mamilos) provam que a moral e a beleza podem não existir, confira nosso outro artigo sobre o tema!
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